Reconto do Conto O
Jantar de Clarice Lispector no gênero notícia
Um homem que come solitariamente num
restaurante
O fato ocorreu dia 16 ,de
outubro de 2012 por volta das 19:30, um homem comendo solitariamente em
restaurante comendo com fúria, revirando a comida e pedindo vinho quando, um velho poderia ter uns sessenta anos, era alto,
corpulento e de cabelos brancos, sobrancelhas espessas e um anel no dedo. Uma
pessoas de longe observava e via que tinha algo de errado com aquele homem no
momento em que ele leva o guardanapo aos olhos ver que ele enxuga uma lágrima, e pelo que ele ver ele aparenta ser forte ele
também comenta que o homem se afasta afastar-se após ter comido como um
louco.
Ao lado do homem
tinha uma mulher que lhe acompanhava magra de chapéu ela ria com a boca cheia e rebrilhava os olhos
escuros. No
momento em que eu levava o garfo à boca, olhei-o. Ei-lo de olhos fechados
mastigando pão com vigor e mecanismo, os dois punhos cerrados sobre a mesa. O garçom dispunha os pratos sobre a toalha. Mas o
velho mantinha os olhos fechados. A um gesto mais vivo do criado, ele os abriu
com tal brusquidão que este mesmo movimento se comunicou às grandes mãos e um
garfo caiu. O garçom sussurrou palavras amáveis abaixando-se para apanhá-lo;
ele não respondia. Porque, agora desperto, virava subitamente a carne de um
lado e outro, examinava-a com veemência, a ponta da língua aparecendo –
apalpava o bife com as costas do garfo, quase o cheirava, mexendo a boca de
antemão, e começava a cortá-lo com um movimento inútil de vigor de todo o
corpo.
Interrompe-se um instante,
enxuga de novo os olhos, balança brevemente a cabeça – e nova garfada de alface
com carne é apanhada no ar. Diz ao garçom que passa Não é este o vinho que mandei trazer. A voz que esperava dele: voz sem
réplicas possíveis pela qual eu via que jamais se poderia fazer alguma coisa
por ele. Senão obedecê-lo o garçom se afastou cortês com a garrafa na mão.
Mas eis que o velho se
imobiliza de novo como se tivesse o peito contraído e barrado. Sua violenta
potência sacode-se presa. Ele espera. Até que a fome parece assaltá-lo e ele
recomeça a mastigar com apetite, de sobrancelhas franzidas. Eu é que já comia
devagar, um pouco nauseado sem saber por quê, participando também não sabia de
quê. De repente ei-lo a estremecer todo, levando o guardanapo aos olhos e
apertando-os numa brutalidade que me enleva... Abandono com certa decisão o
garfo no prato, eu próprio com um aperto insuportável na garganta, furioso,
quebrado em submissão. Mas o velho demora pouco com o guardanapo nos olhos.
Desta vez, quando tira sem pressa, as pupilas estão extremamente doces e
cansadas, e antes dele enxugar-se – eu vi. Vi a lágrima.
Ele terminou. Sua cara se
esvazia de expressão. Fecha os olhos, distende os maxilares. Procuro aproveitar
este momento em que ele não possui mais o próprio rosto, para ver afinal. Mas é
inútil. A grande aparência que vejo é desconhecida, majestosa, cruel e cega. O
que eu quero olhar diretamente, pela força extraordinária do ancião, não existe
neste instante. Ele não quer.
A final tirou os óculos,
bateu os dentes, enxugou os olhos fazendo caretas inúteis e penosas. Passou a
mão quadrada pelos cabelos brancos, alisando-os com poder. Levantou-se
segurando o bordo da mesa com as mãos vigorosas. E eis que, depois de liberto
de um apoio, ele parece mais fraco, embora ainda enorme e ainda capaz de
apunhalar qualquer um de nós. Sem que eu possa fazer nada, põe o chapéu
acariciando a gravata ao espelho. Atravessa o aspecto luminoso do salão,
desaparece.
Quando me traíram ou assassinaram, quando alguém foi embora para sempre,
ou perdi o que de melhor me restava, ou quando soube que vou morrer – eu não
como. Não sou ainda esta potência, esta construção, esta ruína. Empurro o
prato, rejeito a carne e seu sangue.
Adriane e Aline Danniele