sábado, 10 de novembro de 2012


Reconto do Conto O Jantar de Clarice Lispector no gênero notícia

Um homem que come solitariamente num restaurante

O fato ocorreu dia 16 ,de outubro de 2012 por volta das 19:30, um homem comendo solitariamente em restaurante comendo com fúria, revirando a comida e pedindo vinho quando, um  velho poderia ter uns sessenta anos, era alto, corpulento e de cabelos brancos, sobrancelhas espessas e um anel no dedo. Uma pessoas de longe observava e via que tinha algo de errado com aquele homem no momento em que ele  leva o guardanapo aos olhos  ver que ele enxuga uma lágrima, e pelo que ele ver ele aparenta ser forte ele também comenta que o homem se afasta afastar-se após ter comido como um louco.
Ao lado do homem tinha uma mulher que lhe acompanhava  magra de chapéu  ela ria com a boca cheia e rebrilhava os olhos escuros. No momento em que eu levava o garfo à boca, olhei-o. Ei-lo de olhos fechados mastigando pão com vigor e mecanismo, os dois punhos cerrados sobre a mesa. O  garçom dispunha os pratos sobre a toalha. Mas o velho mantinha os olhos fechados. A um gesto mais vivo do criado, ele os abriu com tal brusquidão que este mesmo movimento se comunicou às grandes mãos e um garfo caiu. O garçom sussurrou palavras amáveis abaixando-se para apanhá-lo; ele não respondia. Porque, agora desperto, virava subitamente a carne de um lado e outro, examinava-a com veemência, a ponta da língua aparecendo – apalpava o bife com as costas do garfo, quase o cheirava, mexendo a boca de antemão, e começava a cortá-lo com um movimento inútil de vigor de todo o corpo.
Interrompe-se um instante, enxuga de novo os olhos, balança brevemente a cabeça – e nova garfada de alface com carne é apanhada no ar. Diz ao garçom que passa Não é este o vinho que mandei trazer. A voz que esperava dele: voz sem réplicas possíveis pela qual eu via que jamais se poderia fazer alguma coisa por ele. Senão obedecê-lo o garçom se afastou cortês com a garrafa na mão.
Mas eis que o velho se imobiliza de novo como se tivesse o peito contraído e barrado. Sua violenta potência sacode-se presa. Ele espera. Até que a fome parece assaltá-lo e ele recomeça a mastigar com apetite, de sobrancelhas franzidas. Eu é que já comia devagar, um pouco nauseado sem saber por quê, participando também não sabia de quê. De repente ei-lo a estremecer todo, levando o guardanapo aos olhos e apertando-os numa brutalidade que me enleva... Abandono com certa decisão o garfo no prato, eu próprio com um aperto insuportável na garganta, furioso, quebrado em submissão. Mas o velho demora pouco com o guardanapo nos olhos. Desta vez, quando tira sem pressa, as pupilas estão extremamente doces e cansadas, e antes dele enxugar-se – eu vi. Vi a lágrima.
Ele terminou. Sua cara se esvazia de expressão. Fecha os olhos, distende os maxilares. Procuro aproveitar este momento em que ele não possui mais o próprio rosto, para ver afinal. Mas é inútil. A grande aparência que vejo é desconhecida, majestosa, cruel e cega. O que eu quero olhar diretamente, pela força extraordinária do ancião, não existe neste instante. Ele não quer. 
A final tirou os óculos, bateu os dentes, enxugou os olhos fazendo caretas inúteis e penosas. Passou a mão quadrada pelos cabelos brancos, alisando-os com poder. Levantou-se segurando o bordo da mesa com as mãos vigorosas. E eis que, depois de liberto de um apoio, ele parece mais fraco, embora ainda enorme e ainda capaz de apunhalar qualquer um de nós. Sem que eu possa fazer nada, põe o chapéu acariciando a gravata ao espelho. Atravessa o aspecto luminoso do salão, desaparece.
Quando me traíram ou assassinaram, quando alguém foi embora para sempre, ou perdi o que de melhor me restava, ou quando soube que vou morrer – eu não como. Não sou ainda esta potência, esta construção, esta ruína. Empurro o prato, rejeito a carne e seu sangue. 

Adriane e Aline Danniele 


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